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15 vezes em que Pedro Bial poderia ter usado um detector de mentiras

Observando o histórico de convidados do programa Conversa com Bial, é difícil entender por que o apresentador escolheu Lula como boi de piranha
POR Jáder Santana
Divulgação Globo

Observando o histórico de convidados do programa Conversa com Bial, é difícil entender por que o apresentador escolheu Lula como boi de piranha

Jáder Santana
jaderstn@gmail.com

Pedro Bial não gosta de Lula. Não há muito que possa ser dito em contrário. Em entrevista ao Manhattan Connection, da TV Cultura, nesta quarta-feira, 15, Bial foi perguntado pelo apresentador Lucas Mendes se havia algum convidado que não iria ao seu programa, o Conversa com Bial, da Globo. Bial respondeu: “O Lula, ele já até disse que gostaria de fazer o programa comigo, mas tinha que ser ao vivo. Pode até ser ao vivo, mas aí teria que ter um polígrafo acompanhando todas as falas dele.”

A grosseria gratuita gerou reação imediata nas redes sociais. Luis Claudio Lula da Silva, filho do ex-presidente, tuitou hoje, 15, em resposta ao apresentador – “enfia esse polígrafo no teu cu”. Levando em conta as dimensões físicas e o preço nada módico de um detector de mentiras, que provavelmente causariam aflição violenta a um Bial que já passou das sessenta primaveras, este colunista que vos escreve recomenda ao apresentador o exercício de um olhar retrospectivo. 

Para facilitar tão árdua tarefa, reuni quinze ocasiões, em quatro anos de programa, nas quais Bial poderia ter levado ao seu estúdio um detector de mentiras. 

No último dia 25 de março, Bial conversou com Flordelis sem detector de mentiras. A deputada federal, acusada de ser a mandante do assassinado do próprio marido, culpou duas de suas filhas, Simone e Marzy, pelo crime. 

No dia 22 de fevereiro, Bial conversou com o senador Fernando Collor sem detector de mentiras. O ex-presidente afirmou que o processo que levou ao seu impeachment em 1992 teve motivações estritamente políticas, “um golpe arranjado”, “uma piada”. 

No dia 8 do mesmo mês, Bial conversou com o cineasta Woody Allen sem detector de mentiras. Sobre as acusações de abuso sexual levantadas em 2014 por Dylan Farrow, sua filha com a atriz Mia Farrow, à época com sete anos, Allen disse que está “sendo boicotado”. 

No dia 23 de novembro do ano passado, Bial conversou com Rosângela Moro sem detector de mentiras. Advogada e companheira do ex-juiz Sérgio Moro, Rosângela disse que acreditava que Jair Bolsonaro, depois de eleito, mudaria sua postura agressiva, escolheria ministros com base em critério técnico e daria autonomia para as instituições. 

No dia 19 de outubro, Bial conversou com o general Rêgo Barros sem detector de mentiras. O ex-porta voz de Jair Bolsonaro, que viu a extinção da função que ocupava, reforçou, em diversas ocasiões, surpresa e desilusão com a política autoritária do presidente, como se não a conhecesse. 

No dia 12 do mesmo mês, Bial conversou com Tereza Cristina sem detector de mentiras. A ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do governo Bolsonaro diminuiu a importância das queimadas no Brasil insinuando que não somos o único país devastado por incêndios – “é claro que tem uma onda de calor agora no mundo todo”. 

No dia 24 de setembro, Bial conversou com Luiz Henrique Mandetta sem detector de mentiras. O ex-ministro da saúde foi investigado, por sua atuação como secretário de saúde de Campo Grande, por suspeita de fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois. 

No dia 17 do mesmo mês, Bial conversou com a ministra Damares Alves sem detector de mentiras. A pastora, que agiu nos bastidores para impedir o aborto legal de uma criança capixaba de 10 anos, estuprada pelo tio, afirmou durante a entrevista que deveria ter sido feito uma cesárea no lugar do aborto. 

No dia 20 de julho, Bial conversou com Delfim Netto sem detector de mentiras. O ex-ministro da Ditadura Militar, que manteve íntima relação com os presidentes do período, foi acusado de receber propina de R$ 15 milhões de empreiteiras durante as obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. 

No primeiro dia de junho, Bial conversou com Augusto Aras sem detector de mentiras. Procurador geral da república, Aras defendeu recentemente, durante julgamento no STF, que as igrejas continuem abertas durante a fase mais crítica da pandemia no Brasil. “O estado é laico, mas as pessoas, não”, afirmou. 

No dia 5 de dezembro de 2019, Bial conversou com o general Santos Cruz sem detector de mentiras. O ex-ministro da Secretaria de Governo, ex-aliado de primeira ordem de Bolsonaro, defendeu abertamente Sérgio Moro à época da Vaza Jato: “é uma pessoa que está muito acima desse absurdo aí criminoso de invasão de privacidade de telefone, que presta um serviço ao Brasil incalculável na nossa história.”

No dia 19 de setembro do mesmo ano, Bial conversou com Rodrigo Maia sem detector de mentiras. O ex-presidente da Câmara dos Deputados afirmou, durante a entrevista, que “o que tem de melhor (no governo Bolsonaro) é a narrativa da agenda de reformas que o Paulo Guedes faz”. 

No dia 16 de julho, Bial conversou com o vice-presidente do Brasil, general Hamilton Mourão, sem detector de mentiras. Mourão é entusiasta da Ditadura Militar e, no último dia 31 de março, comemorou o golpe de 1964 em postagem no Twitter – “Neste dia, há 57 anos, a população brasileira, com apoio das Forças Armadas, impediu que o Movimento Comunista Internacional fincasse suas tenazes no Brasil. Força e Honra!”

No dia 11 de abril, Bial conversou com Olavo de Carvalho sem detector de mentiras. O guru intelectual do Bolsonarismo é conhecido por sua adesão a teorias da conspiração, como a acusação de que a Pepsi usaria células de fetos abortados em refrigerantes. Na entrevista, Olavo sugeriu que Bolsonaro nomeasse seus três filhos mais velhos para a cabeça de diferentes ministérios.

Dois dias antes, em 9 de abril, Bial conversou com Sérgio Moro sem detector de mentiras. O polígrafo certamente teria acusado a falsidade do ex-juiz quando disse que gostava de biografias, mas não se lembrava da última que havia lido – “puxa vida, eu tenho uma péssima memória”.

Jáder Santana é jornalista e editor do Bemdito. Está no Instragam e Twitter.

Jáder Santana

Editor executivo do Bemdito, é jornalista e trabalhou como repórter e editor de cultura do jornal O Povo, onde também integrou o Núcleo de Reportagens Especiais. É curador da Festa Literária do Ceará e mestrando em Estudos da Tradução pela UFC.