Bemdito

A boiada de Ricardo Salles passou?

Após queda do Superintendente que apontou possíveis crimes ambientais de Ricardo Sales, aumenta as especulações sobre influência política na PF
POR Juliana Diniz
Agência Brasil

Após queda do Superintendente que apontou possíveis crimes ambientais de Ricardo Salles, aumenta as especulações sobre influência política na PF

Juliana Diniz
julianacdcampos@gmail.com

A Polícia Federal foi responsável pela maior apreensão de madeira ilegal da história. A ação foi alvo de críticas de membros do governo. Após manifestações de descontentamento de Ricardo Salles, Ministro do Meio Ambiente, e do senador Telmário Mota (Pros-RR), o Superintendente da PF na região amazônica, Alexandre Saraiva, respondeu que “na Polícia Federal não vai passar boiada”.

Para o Superintendente, a madeira apreendida é produto de uma organização criminosa que vem desmatando a floresta, ao mesmo tempo em que se aproveita da grilagem de terras. Disse o delegado que é a primeira vez que testemunha uma autoridade ministerial se posicionar contra uma iniciativa policial voltada à proteção da floresta. Salles, por sua vez, acusa o delegado de “demonizar” o trabalho dos empresários dedicados à extração irregular de madeira.

Após as manifestações do ministro e do senador, Alexandre Saraiva enviou ao Supremo Tribunal Federal uma notícia-crime contra as autoridades, indicando a possível prática de advocacia administrativa e embaraço da investigação de infração penal que envolva organização criminosa.

O embate entre o superintendente e o ministro já rendeu as primeiras consequências: o comando da Polícia Federal decidiu promover troca na Superintendência, no que parece ser mais um episódio de interferência política na PF, em claro prejuízo ao combate ao desmatamento no país. O diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Maiurino, irá indicar para o cargo o delegado Leandro Almada.

O governo amarga o isolamento do Brasil no cenário internacional, graças a uma temerária política ambiental, que, em dois anos, foi responsável pelo aumento expressivo dos índices de desmatamento da Floresta Amazônica. A troca do superintendente pode atrapalhar a movimentação de parte do governo de reverter a imagem negativa do país e acontece no mesmo dia em que Jair Bolsonaro envia ao presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, carta em que promete zerar o desmatamento até 2030. “Queremos reafirmar, nesse ato, em inequívoco apoio aos esforços empreendidos por V. Excelência, o nosso compromisso de eliminar o desmatamento ilegal no Brasil até 2030”, escreveu o presidente brasileiro a Joe Biden, que será anfitrião de cúpula ambiental nos dias 21 e 22 de abril.

Embora a carta atenda aos protocolos de aproximação diplomática, nunca é demais lembrar que, em matéria de imagem pública, as ações e os gestos valem sim mais do que as palavras – sobretudo quando elas são ditas por quem não costuma cumprir o que promete.

Juliana Diniz é editora executiva do Bemdito, professora da UFC e doutora em Direito pela USP. Está no Instagram e Twitter.

Juliana Diniz

Editora executiva do Bemdito. É professora do curso de Direito da UFC e Doutora em Direito pela USP, além de escritora. Publicou, entre outras obras, o romance Memória dos Ossos.