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Além de incompetente, suspeito

Decisão do ministro Fachin tenta desviar o foco da suspeição de Sergio Moro, sem sucesso
POR Juliana Diniz
Evaristo Sá/AFP

Decisão do ministro Fachin tenta desviar o foco da suspeição de Sergio Moro, sem sucesso

Juliana Diniz
julianacdcampos@gmail.com

Depois de uma tentativa frustrada de adiamento pelo ministro Edson Fachin junto à presidência do Supremo Tribunal Federal, a 2a turma do STF levou adiante o julgamento do habeas corpus onde foi suscitada a suspeição do ex-juiz Sergio Moro. Para a defesa de Lula, o julgamento da suspeição é fundamental: só a declaração de que Moro agiu parcialmente tem o poder de tornar imprestáveis todos os processos em que Lula foi réu a partir da Lava Jato. A decisão de Fachin, tomada ontem, só tornou inválidos os atos decisórios, porque se prendeu a um aspecto puramente formal – a incompetência do juízo. O julgamento da suspeição, todavia, tem um poder destrutivo maior sobre os processos, por levar dúvida inclusive à instrução, ou seja, à produção das provas. Na prática, o reconhecimento da suspeição reconduz os casos à estaca zero, exigindo o novo ajuizamento de todas as ações, agora perante o juízo competente.

Iniciada a sessão no início da tarde, o ministro Fachin sustentou mais uma vez, agora perante a turma, a necessidade de adiamento da apreciação do tema. Visivelmente isolado, foi vencido pela maioria dos votos, um movimento que pode indicar uma provável derrota: sua manobra do dia anterior não parece ter sido bem recebida por seus pares. Após uma longa leitura de voto por Gilmar Mendes, que voltou a tratar do caso como o “maior escândalo judicial da história”, Kássio Nunes Marques, ministro indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga de Celso de Mello, pediu vista do processo. Como um balde de água fria, o pé no freio do ministro deve levar a um novo adiamento da solução final sobre a parcialidade de Sergio Moro. Carmen Lúcia, que já proferiu voto em 2018 pela negativa da suspeição, resolveu esperar a declaração do voto vista de Nunes Marques para se manifestar novamente. A ministra afirmou estar com voto já pronto, um sinal de que sua avaliação anterior pode ter sido afetada pelos efeitos devastadores da Operação Spoofing. Como ela ainda pode rever sua posição, seu voto é estrategicamente importante, já que a ministra é considerada uma das maiores aliadas dos defensores da operação Lava Jato.

No momento em que escrevo, a sessão ainda perdura, com indicativos fortes de mais um voto pela suspeição, agora do ministro Ricardo Lewandowski. Resta saber como votarão Nunes Marques e Carmen Lúcia, seja para reconhecer a indiscutível parcialidade do ex-juiz da Lava Jato, seja para tentar defender alguma regularidade para o que, à luz do Direito, é injustificável.

Juliana Diniz é editora executiva do Bemdito, professora da UFC e doutora em Direito pela USP. Está no Instagram e Twitter.

Juliana Diniz

Editora executiva do Bemdito. É professora do curso de Direito da UFC e Doutora em Direito pela USP, além de escritora. Publicou, entre outras obras, o romance Memória dos Ossos.