Bemdito

Ciro Gomes e as veredas rumo a 2022

Por que a estratégia de arriscar no antipetismo pode render mais perdas que ganhos a Ciro Gomes
POR Monalisa Soares
Leo Canabarro

As redes sociais e o noticiário político, na última semana, foram dominados pela contenda entre Ciro Gomes e Dilma Rousseff. O ex-ministro declarou em entrevista que Lula haveria conspirado pelo impeachment de Dilma. A treta se adensou no twitter quando a ex-presidenta mencionou a baixa performance de Ciro nas pesquisas de intenção de votos.

À parte do conteúdo e desdobramentos deste episódio, em particular, têm chamado atenção as escolhas políticas de Ciro Gomes na tentativa de tornar viável sua candidatura de terceira via. Em artigo de junho deste ano, aqui no Bemdito, Monalisa Torres destacou a aposta do pré-candidato na busca pela adesão dos “órfãos de uma candidatura à direita que não seja Bolsonaro”.

Nesse sentido, é relevante destacar que, para uma parcela deste eleitorado-alvo, o antipetismo ainda constitui um motivo fundamental para a adesão eleitoral. A conquista desta parcela do eleitorado exige, portanto, a construção de uma imagem pública que expresse um antipetismo genuíno, como o fez Bolsonaro em 2018. 

Ciro Gomes, no entanto, enfrenta o dilema de ter sido, naquele contexto, apresentado como um “tom de petismo” por sua vinculação como ministro do governo petista, sua defesa do mandato de Dilma, sua contrariedade à prisão de Lula e as críticas à operação Lava Jato. Sob essa perspectiva, podemos compreender a recente agressividade nos comentários e acusações apresentados por Ciro contra o PT e suas lideranças. Podemos inferir uma necessidade estratégica de desassociar-se desse passado, mostrando, inclusive, arrependimento, como indicou num dos tuítes em resposta à Dilma Rousseff.

Se, em termos de cálculos políticos, as ações do ex-ministro ganham coerência, isso não significa, no entanto, que não comportem riscos e desafios. A estratégia política traçada impacta diretamente a imagem pública já construída, trazendo desdobramentos para a administração da visibilidade do pré-candidato.

Em primeiro lugar, ao apostar suas fichas no antipetismo, Ciro Gomes cria celeuma com um eleitorado do campo progressista e de esquerda que tenciona a formação da frente ampla em um momento futuro. O episódio recente com Dilma Rousseff materializou a implosão de uma “trégua de natal” que ele mesmo havia proposto. Após a discussão nas redes, a ex-presidenta ganhou seguidores e o ex-ministro perdeu.

Em segundo lugar, como apontei, Ciro Gomes possui, no campo da direita, concorrentes cuja imagem pública refletem um antipetismo mais genuíno e que poderiam ser reconhecidas como opções mais autênticas ao eleitorado de direita. Vide Datena, que lançou sua candidatura na última semana e para quem as pesquisas de intenção de voto sugerem bom potencial de crescimento.

Diante de tais dilemas, Ciro Gomes vem buscando construir rotas alternativas, como a tentativa de atrair Datena para ser seu vice, além de aproximações e diálogos frequentes com as demais candidaturas de terceira via que representam o campo do antipetismo. Na esfera progressista, o ex-ministro confia na consolidação de uma base fidelizada de apoiadores que segue com ele para afiançar que o antipetismo não significa a transfiguração numa candidatura de direita. 

Em resumo, a construção da imagem de antipetista genuíno pode colocá-lo em rota de colisão com posições que garantiram a adesão de outros segmentos do eleitorado, demandando um equilíbrio por vezes difícil de efetivar. O caminho escolhido/encontrado por Ciro Gomes para viabilização da candidatura, no entanto, é cristalino. Se o pedetista irá alcançar o objetivo almejado, cenas dos próximos capítulos. 

Monalisa Soares

Doutora em Sociologia e professora da UFC, integra o Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia e se dedica a pesquisas na interface da comunicação política, com foco em campanhas eleitorais, gênero e análise conjuntura.