Lula e os podcasts: uma nova estratégia comunicacional?
Em seu périplo rumo à disputa presidencial de 2022, Lula vem ensaiando discursos e ações visando sua consolidação como o candidato genuíno do antibolsonarismo. Como afirmei anteriormente, a batalha comunicacional constitui elemento relevante desse processo e, no caso do ex-presidente, a administração de sua comunicação política não é tarefa simples, pronta e acabada. Nos últimos meses, Lula tem reunido esforços significativos neste campo.
Em novembro, sua viagem pela Europa repercutiu positivamente revelando o prestígio que o ex-presidente desfruta junto a lideranças internacionais. Esses eventos contribuíram para a dinâmica da pré-campanha, gerando significativa mobilização nas redes sociais, com muitas menções ao ex-presidente que disseminaram uma imagem positiva de Lula. Nem tudo foram flores, no entanto, nas redes sociais. No retorno do tour, o petista enfrentou também reações negativas às suas declarações, dadas na entrevista ao jornal El País, sobre Daniel Ortega e seu governo em Nicarágua. Esses episódios são relevantes para destacar como o ex-presidente tem se posto em evidência, mobilizando o debate público.
Neste início de dezembro, Lula mantém seu protagonismo, de modo especial, nas redes sociais. Sua participação no Podcast Podpah gerou uma repercussão significativa. Segundo Dados do Dapp/FGV (Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas), a entrevista mobilizou mais de 310 mil menções ao petista no Twitter, sendo que estas chegaram a alcançar mais de 50 mil menções por hora em determinado período da transmissão. Em termos de visualizações simultâneas no YouTube, o podcast atingiu 280 mil. Até o momento em que esta coluna é escrita o vídeo da entrevista já alcançou 6.818.819 visualizações.
Pesquisa realizada pela Arquimedes apontou ainda que a participação do ex-presidente trouxe ganhos à sua imagem, considerando que 88% das menções a Lula nas redes sociais foram positivas e que o público alcançado pelo Podpah extrapola a “bolha” dos perfis já vinculados ao petista. De acordo com Pedro Bruzzi, um dos sócios da Arquimedes, “Lula se adaptou muito bem ao público do podcast” tratando de temas variados e falando de política numa forma mais simples, conseguindo ampliar a audiência.
Na última semana, em meio à divulgação das retrospectivas de 2021, o serviço de streaming Spotify divulgou que o episódio de podcast mais ouvido do ano no Brasil foi a entrevista conduzida por Mano Brown com Lula, no programa Mano a Mano. Na participação ocorrida em setembro, o rapper e o ex-presidente dialogam sobre diversos temas entre os quais a onda de insatisfação e antipolítica; a necessidade da aproximação do ex-presidente com a juventude; e sobre a contundente fala de Mano Brown no comício de Haddad em 2018, na qual teceu duras críticas ao PT.
A incursão do petista no universo dos podcasts parece que seguirá a todo vapor. Déia Freitas, criadora do Não Inviabilize (um dos maiores podcasts brasileiros), anunciou que fará episódio com Lula contando sua história e criará episódios com histórias de beneficiários/as de programas dos governos petistas, trazendo ao final comentários do ex-presidente.
A ofensiva comunicacional de Lula nos podcasts ocorre num momento bastante oportuno. Pesquisa realizada pelo Globo indicou que 57% dos/as brasileiros/as tiveram sua iniciação pelo universo dos podcasts durante a pandemia. Entre os/as que já consumiam esse tipo de produto houve um aumento de 31% no mesmo período. Em termos de frequência, 43% dos/as entrevistados/as escutam podcasts de uma a três vezes na semana.
O domínio político expressivo da direita nas redes sociais levou a muitas discussões sobre como a esquerda poderia desenvolver estratégias para avançar e disputar este espaço. Para Marco Aurélio Ruediger, chefe da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da FGV, a repercussão massiva e positiva da entrevista de Lula ao podcast Podpah pode significar uma abertura para a criação e consolidação de estratégia comunicacional.
De acordo com Ruediger, Lula e o PT tinham/têm o desafio de falar uma linguagem mais adaptada ao público jovem das redes (algo que Mano Brown mencionou em sua entrevista), apresentando novas propostas mais direcionadas ao futuro. Sobre a participação do ex-presidente, o sociólogo afirmou que a recepção foi bastante positiva pois “Lula não ficou na formalidade do espaço tradicional de um espaço na televisão. É uma forma de construção, estava muito relaxado e à vontade”. Outro aspecto que tem favorecido a recepção do discurso do petista é sua capacidade de empatia pelas condições econômicas difíceis que grande parte da população tem vivido, nesse sentido, Lula tem conseguido “furar a bolha e invadir o centro”.
A viagem para a Europa contribuiu para Lula retomar a dianteira, ultrapassando novamente Bolsonaro, no levantamento da Quaest sobre o Índice de Popularidade Digital (IPD). Após seu discurso no Parlamento Europeu, o petista cresceu 12 pontos, chegando a 63,9 contra 57,9 do atual presidente. A série histórica do IPD mostra, no entanto, que o ex-presidente tem uma trajetória oscilante nesse campo, entre altos e baixos. Considerando que os desafios de comunicação política de Lula não são facilmente contornáveis, haja vista que ele é uma liderança diretamente implicada no contexto polarizado, aguardemos para ver o quanto essa estratégia comunicacional de furar a bolha via podcasts alcançará sucesso em seu percurso rumo a 2022.