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Mais candidato do que nunca

O retorno triunfante da mais carismática liderança política que o Brasil já conheceu
POR Juliana Diniz
Miguel Schincariol/AFP

O retorno triunfante da mais carismática liderança política que o Brasil já conheceu

Juliana Diniz
julianacdcampos@gmail.com

O pronunciamento de Lula foi épico pelo que representa em termos de fechamento de um ciclo. Lula não é apenas um político que vem da classe trabalhadora e se tornou o presidente mais popular do país, é agora uma liderança carismática de alcance internacional que enfrentou uma sequência de processos judiciais cheios de falhas e sobreviveu para contar sua versão de sua história. O tom de sua fala pode ser resumido no tweet de Fernando Haddad, publicado no dia em que Fachin anulou as condenações do ex-presidente: “por justiça, a luta sempre vale. Sem ela, não há paz”.

A verdade é que a decisão de Fachin deu a Lula a oportunidade perfeita de personificar o papel de mártir, um papel com imensa força de engajamento e impacto eleitoral. O mártir político é um líder seviciado e injustiçado, aquele que, apesar da tragicidade da própria vida, tem as forças renovadas, pronto a mais uma vez se oferecer em serviço para seu povo. Apesar de ter permanecido encarcerado por 580 dias, sofrido dramas pessoais como a perda do irmão, da esposa e do neto, e empreendido uma cruzada judicial que mobilizou dezenas de órgãos jurisdicionais brasileiros, o Ministério Público, a Polícia Federal e a classe política, Lula se disse pronto a trabalhar, falou com firmeza, resgatou um humor de otimismo, invocou para luta, declarou-se sereno, sem ressentimentos, distribuindo afagos.

Conversando ora com o povo, ora com seus opositores e possíveis aliados, o ex-presidente fez jus à fama de orador implacável, uma liderança capaz de se comunicar com simplicidade para as massas, sem perder a capacidade de passear pelos mais variados assuntos no esforço de demonstrar o irrefutável: o Brasil não tem governo. Disse para que todos entendessem: é possível voltar a sonhar com um país em que o brasileiro não se preocupará mais com a fome, o pãozinho com café quente pela manhã, a cerveja com picanha nos finais de semana. Ofereceu o que pode haver de mais potente em qualquer empreendimento eleitoral: o sonho, a esperança, a perspectiva de um futuro feliz. Não esqueceu do humor, ofereceu à internet uma profusão de memes: cadê o Zé Gotinha? A terra é redonda!

Foi sarcástico quando convinha ser, inflamado quando cabia, calmo e tranquilo nas pausas dramáticas que preparavam sua audiência para o arrebatamento. Postou-se diante de um púlpito decorado com a foto do fatídico dia em que, nos braços de uma multidão, ofereceu o corpo ao espetáculo do encarceramento desejado pela Lava Jato. A cena do ano de 2018, quando o ex-presidente falou aos apoiadores antes de ir à prisão, pode agora ser resgatada no imaginário coletivo como a prova de um crime – não o do encarcerado, mas o do encarcerador que pune sem a autoridade para punir.

Existe uma percepção geral de que, na tentativa de salvar a Lava Jato, Fachin cometeu um grande erro. E é verdade. O erro de avaliação cometido por Fachin foi o mesmo erro cometido por tantos outros, como Dallagnol e Sergio Moro – o erro de subestimar o capital político absolutamente singular de Lula, um homem que sabe fazer política e incorporar o papel de estadista como poucos.

A reação do governo em crise ao retorno triunfante do ex-presidente foi imediata. Foi ridículo o pronunciamento de um desconcertado Bolsonaro de máscara, falando em vacinas e em preocupação sanitária. Uma pantomima incapaz de convencer o mais inflamado dos apoiadores do atual presidente.

Lula nos ofereceu um presente que pode nos livrar do caos ao absoluto: uma oposição forte, capaz de estocar um Bolsonaro até então confortável na sua omissão, na sua inoperância, na sua indiferença à mortalidade.

O Brasil tá on.

Juliana Diniz é editora executiva do Bemdito, professora da UFC e doutora em Direito pela USP. Está no Instagram e Twitter.

Juliana Diniz

Editora executiva do Bemdito. É professora do curso de Direito da UFC e Doutora em Direito pela USP, além de escritora. Publicou, entre outras obras, o romance Memória dos Ossos.