Bemdito

A batalha pelo voto feminino na disputa de 2022

Como Jair Bolsonaro e Lula trabalham para ganhar a fatia mais estratégica do eleitorado: as mulheres
POR Monalisa Soares

As movimentações da última semana mostraram como as campanhas presidenciais  estão a todo vapor. Em suas ações recentes, tanto a campanha de Lula quanto a de Bolsonaro reconheceram um aspecto que se sobressai na disputa deste ano: a exigente busca pela adesão eleitoral das mulheres.

Segundo dados do TSE, a discrepância entre a totalidade do eleitorado feminino e masculino chegou a 8,5 milhões em favor delas. Proporcionalmente essa diferença representa 53% x 47% e consolida o aumento do peso do voto feminino que vem crescendo desde 2002.

As pesquisas recentes de intenção de votos (CNT/MDA e Genial Quaest), por sua vez, apontam vantagem de Lula em relação a Bolsonaro entre as mulheres. Na sondagem CNT/MDA, o petista pontua 43,5% contra 25,9% do atual presidente no primeiro turno. Já no segundo turno, a diferença se amplia e passa para 54,1% X 31,3%. A pesquisa Genial Quaest confirma a discrepância da preferência feminina no primeiro turno entre os concorrentes: 50% para Lula contra 24% para Bolsonaro.

Consolidando-se esse cenário, teremos a reedição de um fenômeno que singularizou a disputa de 2018, conforme análise do cientista político Jairo Nicolau: a assimetria entre homens e mulheres na adesão a candidaturas presidenciais. De acordo com Nicolau, até 2018 “os candidatos competitivos à presidência obtiveram níveis semelhantes de apoio entre os dois gêneros. Isso aconteceu mesmo quando havia mulheres concorrendo (Dilma e Marina)”.

A eleição de Bolsonaro demarca, portanto, uma ruptura no padrão anterior. O maior apoio do presidente entre os homens ante as mulheres se mantém nas pesquisas atuais. Segundo levantamento da CNT/MDA a discrepância é de 38,2% x 25,9%; a Quaest confirma os dados representados na diferença de 38% x 24%. A série histórica das pesquisas também aponta que, ao longo do governo, as mulheres constituíram um dos segmentos que mais reprovou a gestão de Bolsonaro.

Considerando a significância eleitoral das mulheres e a rejeição enfrentada pelo atual presidente neste segmento, sua campanha decidiu escalar Michelle Bolsonaro para engajar-se na disputa visando diminuir resistências. Entre suas atividades estão a maior participação em eventos junto ao presidente, além de uma agenda própria em que busca proximidade com as mulheres e evangélicos/as. Vale lembrar que em 2018, Michelle teve papel importante no programa eleitoral de TV dedicado a desconstruir a percepção negativa que o eleitorado feminino tinha de Bolsonaro, com falas direcionadas às mulheres e  famílias de pessoas com deficiência.

Relevante destacar que a  ampliação da participação da primeira-dama na campanha à reeleição é uma estratégia que se ampara numa percepção identificada em pesquisas, como a realizada pelo Instituto Qualibest que aponta Michelle entre as mulheres mais admiradas do Brasil. Desde o primeiro ano do mandato de Bolsonaro, ela é sempre mencionada.

No último domingo, a primeira-dama entrou definitivamente no jogo da sucessão participando do Pronunciamento à Nação junto à Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Cristiane Rodrigues, por ocasião do dia das mães. Num aceno evidente às mulheres, o pronunciamento buscou apresentar diversas iniciativas do governo federal para as “mães brasileiras”.

O discurso de Michelle Bolsonaro, além de exaltar as ações do governo federal, foi permeado de termos religiosos: “mulheres que são uma benção para o nosso Brasil”; “Ser mãe é chamar para si a maior e mais divina das responsabilidades”. Ao finalizar, Michelle saudou as mulheres: “Encerramos abraçando todas as mães deste Brasil. As donas de casa, as chefes de família, as mães-avós. As mães com filhos com deficiência, as mães raras, as mães indígenas, quilombolas ou ribeirinhas. Todas as mães heroínas deste País. Que Deus nos abençoe e proteja a nossa missão”.

Além das ações da primeira-dama, a campanha de Bolsonaro também investiu na propaganda partidária do Partido Liberal (PL) para enfrentar a rejeição das mulheres. Em uma das peças, afirma-se que o governo tem diversas ações de combate à violência contra a mulher e destaca que as “relações entre homens e mulheres devem ser baseadas na fé, no amor e no respeito”. Em outra inserção o texto indica que “É no governo do presidente Bolsonaro que as mulheres são verdadeiramente valorizadas e protegidas”.

Diante da ofensiva do atual presidente no tema, a campanha de Lula  atuou para fortalecer a vantagem do petista no segmento feminino do eleitorado. No lançamento de sua pré-candidatura, além do discurso efusivo do candidato a vice na chapa, Geraldo Alckmin, tivemos uma expressiva participação de Rosângela da Silva, noiva do ex-presidente. Janja conduziu o momento de maior emoção do evento: o lançamento do jingle “Lula lá” repaginado, produzido por ela e pelo fotógrafo Ricardo Stuckert. Segundo Janja, o vídeo, que trazia diversos artistas cantando a música da campanha, era seu presente de casamento ao petista.

Lula, por sua vez, iniciou seu discurso saudando as mulheres, nas pessoas de Janja e da ex-presidenta Dilma Rousseff: “Quero parabenizar as mulheres brasileiras pelas conquistas que já obtiveram e pelas conquistas que vão obter a partir das eleições de 2022. Vocês não são maioria apenas numericamente, vocês são maioria na capacidade de elaboração de propostas e na capacidade de luta. […] Minha solidariedade a todas as mulheres”

Ao prestar solidariedade às mulheres e exaltar suas habilidades para a vida política, a fala do ex-presidente intentou demarcar sua diferença central de Bolsonaro: Lula não abrirá mão de falar diretamente às mulheres, ainda que tenha ao seu lado lideranças femininas que podem atuar como interlocutoras neste segmento. 

A campanha de Bolsonaro segue na batalha pelo voto feminino. Ainda que a rejeição ao atual presidente seja expressiva entre as mulheres, é valioso lembrar que em 2018 ele conseguiu diminuir as resistências, especialmente, entre as evangélicas. À campanha de Lula cabe afiar a comunicação com o segmento feminino. Quanto menos ruído, maiores as chances de consolidar e reproduzir a vantagem no pleito eleitoral.

Monalisa Soares

Doutora em Sociologia e professora da UFC, integra o Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia e se dedica a pesquisas na interface da comunicação política, com foco em campanhas eleitorais, gênero e análise conjuntura.