Bemdito

Bemdito: o futuro

O que o novo momento do Bemdito significa e para onde estamos indo nesse oceano de informações
POR Jáder Santana

O que o novo momento do Bemdito significa e para onde estamos indo nesse oceano de informações 

Jáder Santana
jaderstn@gmail.com

Dizer que o jornalista de redação nutre sentimentos de amor e ódio pelo ambiente de trabalho e que essa oscilação de impressões atinge o próprio fazer jornalístico é, de certa forma, reducionista. Quem passa pelos ambientes de preparação e difusão de informação, por veículos de imprensa tradicionais, vê suas emoções transitarem por muitos outros extremos: dependência, impotência, excitação, ira, frustração, ansiedade, companheirismo. É preciso ter algum equilíbrio emocional, boas doses de resignação e uma gaveta de benzodiazepínicos e imidazopiridinas para sobreviver.  

É preciso saber também que estabilidade mental, resignação e medicamentos podem não ser suficientes. Passei duas grandes temporadas em redações. Primeiro, de 2009 a 2013, em uma agência de informação sobre direitos humanos e em um grande jornal. Depois, o mesmo grande jornal, de 2015 a 2020. Decidi me afastar, em ambas as ocasiões, por estar no limite de uma estafa emocional que nenhum comprimido parecia dar jeito. Completei a mudança buscando outros campos de atuação e permaneci fiel a esse novo estilo de vida até que a saudade pelas redações falasse mais alto.

A ideia para o Bemdito surgiu na primeira metade de 2020: uma professora de Direito que se descobria cada vez mais atraída pelo jornalismo e um jornalista que vivia tranquilo o seu lento processo de dessaturação das redações. O Brasil e o mundo já viviam em pandemia, a desinformação atingia níveis assustadores, estávamos cansados da falta de diversidade de vozes, de pontos de vista, de trajetórias, de geografias. Se aceitei encarar esse retorno, foi por acreditar que, mais do que nunca, o jornalismo é essencial.

Nesses três meses de Bemdito, a surpresa tem sido o sentimento constante, e reencontrei uma parte importante do jornalismo: a descoberta. Descobri intelectuais da floresta, cearenses espalhados pelo mundo, um coletivo de drags, um pastor que escreve sobre sexo. Confirmei velhas suspeitas, desconstruí impressões. Escrevi sobre suruba, Cuba, Karol Conká e Susan Sontag. O Bemdito me surpreende diariamente como leitor e como autor. 

A reformulação de projeto gráfico que chega hoje aos nossos seguidores é mais um passo dessa constante busca por inovação que está em nosso DNA. Queremos oferecer uma plataforma cada vez mais dinâmica, inventiva e experimental. Estamos atentos a todas as mensagens que vocês nos enviam, suas críticas, elogios, sugestões. Não temos o peso e a estrutura imobilizante de um grande veículo, então podemos juntar nossos caquinhos em uma mochila e mudar sempre que der na telha.

A experiência nas redações também me ensinou que o jornalismo é um exercício de humildade, e que o nosso patrão não é quem está sentado numa poltrona confortável no último andar do edifício, mas aqueles que pisam o asfalto, enfrentam as lotações do ônibus e esperam a vacina sem furar a fila. Esse reconhecimento exige independência, essa independência tem um preço.

Nossa opção por recusar, enquanto for possível, o aporte de investimentos de empresas privadas é elemento central dessa decisão de escapar do que em algum momento transformaria o Bemdito naquilo de que fugi por tanto tempo. Em breve, nas próximas semanas, lançaremos uma campanha de apoio e financiamento coletivo. Precisamos de sua ajuda e do seu reconhecimento para continuar existindo. 

Muitas outras novidades serão apresentadas até o fim do ano, ferramentas que vão nos aproximar dos leitores e permitir uma troca mais orgânica de experiências e opiniões. Não temos a receita definitiva para o bom jornalismo, somos uma jangada cearense no oceano turvo de grandes corporações midiáticas que disputam nossa audiência enquanto também tentam descobrir o segredo da reinvenção. O que temos a nosso favor é a independência. Nós conduzimos nosso barquinho. E ele vai pra onde a gente quiser. 

Jáder Santana é jornalista e editor do Bemdito. É mestrando em Estudos da Tradução pela UFC e curador da Festa Literária do Ceará (Flac). Está no Instragam.

Jáder Santana

Editor executivo do Bemdito, é jornalista e trabalhou como repórter e editor de cultura do jornal O Povo, onde também integrou o Núcleo de Reportagens Especiais. É curador da Festa Literária do Ceará e mestrando em Estudos da Tradução pela UFC.