Bemdito

Um parque para Raquel

O que um parque representa de possibilidades de lazer e alegrias compartidas?
POR Ivna Girão
Foto: Tatiana Fortes

“A pipa custa 2 reais, senhora, pode levar. É um festival, tem mais de 200 voando no céu”, assim, o vendedor me convenceu a soltar uma raia, uma brincadeira das boas, no auge dos meus 36 anos. A vista é essa mesma: um horizonte em revoada. Imagino, num devaneio meu, a menina Rachel de Queiroz toda serelepe, sendo feliz no Parque que ganha o seu nome, uma bonita homenagem à escritora e um presente para quem curte o verde e o ar livre, a caminhada despretensiosa, o cantos dos pássaros e o viver em natureza. Na companhia dos meus filhos, voltei no tempo e soltei pipa e minha felicidade aos ventos. 

Maior do município e segundo maior do estado, o Parque Rachel de Queiroz, inaugurado no último dia 15 de fevereiro, está localizado no bairro Presidente Kennedy, na região oeste de Fortaleza e conta com 10 km de extensão e área total de aproximadamente 203 hectares. O espaço conta com calçadão para caminhadas, ciclofaixa bidirecional, paisagismo, mobiliários urbanos, bicicletários, anfiteatro, pontes de acesso, quiosques, além de diversos equipamentos para o lazer e prática de esportes, como quadras, areninha, pet place, espiribol, playground e novos espaços para convivência em contato com a natureza. 

O novo parque ganhou também paisagismo com o plantio de mais de 2.400 espécies de plantas, como arbustos, árvores e palmeiras, além de estação de tratamento conhecida como wetlands, com nove micro lagoas que utilizam um sistema natural de tratamento de efluentes com plantas aquáticas para fitorremediação e decantação, responsáveis pela melhoria da água na região.

Eu cresci no bairro Presidente Kennedy, morei na Quadra E, ali bem ao lado da área verde. Era meu lugar diário de passagem, caminho da escola, foi lugar das brincadeiras de infância, onde colecionei minhas primeiras aventuras de garota: a Ivna-menina que brincava de soltar pipas e de pegar peixe beta para, em casa, depois, botar os animais para brigar. Danações de piveta, talvez danações também de Rachel de Queiroz. Se a escritora está feliz com o Parque em sua homenagem, imaginem eu? Que cresci vendo o “mato” ali virar lixo, e os riachos virarem esgoto, triste. Era uma bela mata que, com o descaso, estava virando “terreno baldio”. Salve salve que a região virou parque e o local foi urbanizado e está sendo hoje bem cuidado, vida longa! Que alegria poder voltar e, dessa vez, brincar de raia com Rachel, Bento, Maria, Amaro e Pilar. 

E para quem me pergunta para que servem as pipas e as tardes livres, gosto de pensar na inutilidade das coisas, nem sempre falo de coisas importantes. E lembro do trecho de um livro que estou lendo – vou terminar a leitura no sábado, lá no Parque, se Deus quiser: 

“- E do que o povo precisa, então? 

– Sei lá. Ioga, kickboxing, poesia, revolução. Educação de verdade, alegria de verdade, jardins, pedicure, ceviche. Ginástica rítmica, esgrima. Muito abacate, quinoa. Pedras afiadas, superpoderes, amuletos. E uns bons ténis. E sobretudo sexo, todos os dias, a cada oito horas, religiosamente, como se toma antibiotico. Mas sexo de qualidade altissima, superlativa, cósmica. E boa música”. (O Poeta chileno, de Alejandro Zambra). 

Conheçam o Parque Rachel de Queiroz, guardado lá no bairro Presidente Kennedy, em Fortaleza, Ceará.  

Ivna Girão

Jornalista, historiadora e escritora, é coordenadora de comunicação da Secretaria de Cultura do Ceará.