O retorno das coligações partidárias
A volta do recesso parlamentar na Câmara dos Deputados veio em ritmo acelerado de votações. Sobre o sistema eleitoral, a rapidez se deve ao fato de que, para valer já para 2022, a tramitação completa deve ser feita até outubro deste ano.
Semana passada, o voto impresso se tornou matéria votada e vencida. O distritão, outro projeto enunciado nos últimos meses, também foi vencido em um acordo. As coligações partidárias não estavam em pauta, mas foram colocadas e o seu retorno, aprovado. Hoje a proposta é discutir sobre a ligação entre coligações, cláusula de desempenho eleitoral e estratégias eleitorais.
Em 2017, por meio de uma PEC, as coligações eleitorais deixaram de ser permitidas para os cargos do Legislativo. As coligações eram, até 2020, alianças entre partidos durante as eleições. Funcionavam como um bloco para contabilizar os votos, o que significa que, votando em um candidato do partido “X”, se este for aliado do partido “Y”, ajudava-se a eleger um candidato deste último também.
Por que era interessante para os partidos participar de uma coligação? Para atingir o chamado quociente eleitoral que consiste no número mínimo de votos válidos que a legenda ou coligação precisa atingir para ter uma cadeira no Legislativo. A distribuição das cadeiras é proporcional ao número de votos dos partidos cada vez que eles atingem o quociente.
Segundo a PEC de 2017, a partir das eleições de 2020, o partido teria direito à cadeira no Legislativo caso atingisse, sozinho, o quociente eleitoral partidário. Ainda na PEC, foi estabelecida a cláusula de desempenho eleitoral que funcionaria de forma progressiva, com referência nas eleições do Legislativo nacional. Iniciaria em 2% dos votos válidos até chegar em 3% em 2030. O percentual deve ser distribuído em no mínimo três estados. No caso de o partido não atingir o percentual, mantém a cadeira, mas perde acesso ao fundo partidário e às propagandas em rádios e TV.
O objetivo principal da cláusula e do fim das coligações é diminuir o número de legendas. Para o cientista político Jairo Nicolau, há dificuldade em administrar os recursos de maneira que todos os partidos sejam atendidos. Diz, ainda, que a dispersão partidária cria dificuldades para o eleitor diferenciar as legendas e os seus projetos.
Em 2020, tivemos nossa primeira eleição sem coligações e com a cláusula de desempenho implementada de forma progressiva. A consequência esperada aconteceu. Segundo o DIAP, de 33 partidos concorrendo, 15 atingiram o percentual de 2%. A previsão é que, caso o desempenho se repita em 2022, a Câmara dos Deputados reduziria de 24 para 18 legendas.
“Federação partidária”
Se, ainda, esse dado se repetir em 2022, algumas legendas pequenas saem prejudicadas – PC do B, Rede, PV, PSOL, PROS, PTC e Novo. O efeito esperado era que as pequenas legendas se distribuíssem entre os partidos médios e grandes com estrutura nacional organizada.
Por exemplo, ainda segundo Jairo Nicolau, PSD, DEM, Republicanos e PP tiveram bom desempenho nas eleições municipais de 2020 e possuem organização herdada da ARENA. Nesse caso, as pequenas legendas vinculadas ao espectro político da direita tenderiam a esse movimento de migração. Na esquerda, o PT possui maior organização nacional, o PSB e o PDT ficariam como uma alternativa e o PSOL, como um polo. No Centro, ficaria o PSDB e o MDB, mas eles não tiveram bom desempenho nas eleições municipais.
Entretanto, não há sinalização de fusão até o momento. A alternativa que se propõe, mas sem adesões significativas, é a chamada “federação partidária”. A proposta é que exista a possibilidade de os partidos se aliarem, mas, diferente das coligações, essa aliança não poderá ser rompida após as eleições. Assim, a federação teria um funcionamento durante toda a legislatura, com um programa, estatuto e direção comuns aos partidos vinculados. Porém, não há adesão parlamentar para essa proposta.
Na semana passada, foi colocado em votação o sistema eleitoral chamado “distritão” que tinha como proposta transformar as eleições para o Legislativo em majoritárias (expliquei o “distritão” em publicação nesta coluna). Com a possibilidade de aprovação desse sistema, as lideranças colocaram em pauta o retorno das coligações, pois, com este retorno, não há viabilidade para o modelo, pois majoritário e proporcional para o mesmo cargo são incompatíveis. Assim, por um acordo para derrubar o “distritão”, a volta das coligações foi aprovada com 333 votos a favor e 147 contra em primeiro turno de votação.
No segundo turno de votação, o retorno das coligações foi aprovado por 337 votos a favor e 135 contra. O texto foi encaminhado para o Senado. Aqueles que argumentam a favor indicam que, com elas, haverá maior representação de partidos, e ainda que as coligações são tradicionais no sistema eleitoral brasileiro – assim, haveria possibilidade de alianças entre as legendas.
Para ser efetivada, precisa da aprovação no Senado. Por enquanto, inquieta observar que uma mudança tão recente já seja questionada. A lógica implícita é que são as regras que fazem o jogo político e pouco se olha para os agentes políticos que movimentam essas regras. Desse modo, há insegurança institucional com constantes alterações do sistema e, consequentemente, maior dificuldade para que as regras do jogo político fiquem claras para os eleitores.
Por fim, somente após as novas configurações do sistema serem aprovadas no Senado, saberemos quais estratégias serão utilizadas pelos partidos para as eleições de 2022.