Bemdito

É preciso estar atento e forte

Ditadura militar não é questão de opinião, é estudo sério e ciência
POR Alex Mourão
Foto: Paulo Pinto

Ditadura militar não é questão de opinião, é estudo sério e ciência

Alex Mourão
alex.mourao5@gmail.com

A semana passada começou bem agitada, na segunda feira só se falava na minirreforma ministerial, inclusive com live de Juliana Diniz e Monalisa Lopes, duas analistas de sensibilidade ímpar. Depois, Jáder Santana falou sobre os nossos sustos ao amanhecer das segundas-feiras nos últimos dois anos. Ainda, a mudança do ministro da defesa e dos chefes do exército, da marinha e da aeronáutica.

Depois, o próprio 31 de março e as redes sociais enlouquecem.

De um lado, vários falando que não foi golpe nem ditadura, mas sim uma revolução encomendada pela tradicional família brasileira. Sempre essa simpática família, atualmente composta pelo cidadão de bem. E para provar a tese postavam fotos da “marcha da família com Deus pela liberdade”. Outros, como esse que aqui escreve, postaram que foi golpe sim, que foi ditadura sim. Escutei muitos que me perguntavam: “e eu não posso ter minha opinião? Não posso achar que não foi ditadura?”. Não, não pode. Esse é um daqueles tópicos que não é uma questão de opinião, mas como bem dito pelo Paulo César Gomes, amigo e historiador dos bons, isso não é opinião, mas estudo sério. Ciência mesmo. Logo, com a alegria dos que tem razão, e a tristeza por estar certo (até porque ninguém com um mínimo de sentimento pode comemorar um golpe militar, a ditadura e mortes): sim, foi golpe. Sim, foi ditadura. Sim, teve tortura. Sim, precisamos lembrar para não repetir. Sim, é feio comemorar esse tipo de coisa. Parece que de santo mesmo, só o feriado tão esperado, e que tanto estávamos precisando.

As colunistas e articulistas aqui já trataram o tema da democracia de forma muito boa e no calor da hora, mas deixei passar um pouco o tempo exatamente para falar com o distanciamento, microscópico, é verdade, mas já se passou uma semana. Se eu quiser fazer parecer mais tempo, posso até dizer que os eventos se deram no mês passado. Pronto. Distanciamento temporal alcançado.

Além do Bemdito, boa parte da imprensa nacional e alencarina debateram sobre a democracia e seu fim em 1964, bem como sobre a democracia e sua fragilidade em 2021. Entre um e outro, passando por 1988 e a Constituição que vigora até hoje. Por vezes surrada, mas em vigor. Ainda. Fora os comentaristas sérios, muito outros, nem tão sérios assim, tentaram de forma tosca explicar o que seria a tal da mobilização nacional proposta pelo líder do PSL na Câmara dos Deputados, Major Vitor Hugo.

Segundo o texto, a medida permitiria ao governo federal, em caso de guerra ou crise de saúde pública, uma maior interferência nas ações dos estados e dos municípios, ou seja, além de risco à democracia ainda implicava na concentração de poderes em Brasília, por exemplo, para fazer o enfrentamento a pandemia. Ou seja, o que hoje já é um problema para governadores e prefeitos que se empenham no combate à pandemia, ficaria ainda pior. Muito pior. Em tempos de pandemia, o que é ruim ganha uma força adicional. A proposição além de descolada da realidade ainda tinha um forte cheiro de 1964. Já nasceu velha. Vou nem falar que inoportuna.

Continuando a nossa semana, exemplos de ontem e de hoje foram lembrados. Alguns falaram de Viktor Orban na Hungria e como o governo brasileiro poderia caminhar no mesmo sentido. Outros lembraram a ditadura com certo saudosismo, falaram até que nem tinha corrupção na época. Acho que as pessoas confundiram história com ficção.

Acho que a semana que foi curta em dias úteis rendeu tanto que até hoje estou pensando nela. Na verdade, acho que a semana passada deve ficar em nossa memória sempre, nos lembrando que a cada dia a democracia pode ser solapada, que não se trata de uma conquista acabada, mas de uma conquista que deve ser repetida, debatida, aperfeiçoada e protegida todos os dias. Todos os dias são 31 de março, para lembrar que foi golpe, que foi ditadura, que muitos foram torturados, outros tantos morreram e que não pode ser comemorado e nem repetido. Por fim, como cantaram Gil e Caetano: É preciso estar atento e forte!

Alex Mourão é professor universitário. Está no Instagram.

Alex Mourão

Professor universitário, graduado em Filosofia e Direito, mestre e doutorando em políticas públicas.