Juventudes e políticas em ambientes digitais
Desde Junho de 2013, discute-se como a internet, especialmente através das redes sociais, constituiu-se um novo espaço para engajamento e organização política dos/as jovens. De acordo com dados da pesquisa TIC Domicílios 2020, no Brasil, 96% dos/as jovens com idade entre 16 e 24 anos informaram ser usuários de internet. De um modo geral, a relevância das tecnologias e sua influência nos processos políticos e eleitorais levantaram discussões sobre as conexões entre juventude e participação política.
Os estudos no âmbito das Ciências Sociais têm buscado compreender os impactos das novas tecnologias na socialização política das juventudes. Tais pesquisas, têm entre seus desafios captar as diversas formas e conteúdos que mobilizam a participação dos/as jovens nos ambientes digitais.
Alguns dados divulgados por levantamentos recentes contribuem para traçar um quadro geral da experiência juvenil em relação à política no contexto da internet. Pesquisa realizada pelo Instituto IPEC, encomendada pelo Avaaz e pela Fundação Tide Setubal, apresentada em outubro de 2021, revelou que os/as jovens têm percebido o debate político brasileiro como agressivo (80%), e que este se tornaria ainda mais nas redes sociais (83%). A percepção da intolerância repercute no engajamento deles/as nos debates: 59% não falam de política nas redes sociais por medo de ataques e “cancelamento”.
Tais tensionamentos, por sua vez, não desmobilizam a intenção de participação no processo eleitoral, quando questionados/as, 82% dos/as entrevistados/as com idade entre 16 e 18 anos afirmaram interesse em tirar o título para votar nas eleições deste ano. Entre os temas mais relevantes para esse segmento do eleitorado: combate à fome, geração de empregos e preservação ambiental. As questões econômicas têm relevância quando se trata das preocupações dos jovens com os problemas nacionais, o que os coloca em consonância com as demais faixas etárias das pesquisas de intenção de voto.
Outra pesquisa divulgada recentemente, esta qualitativa, vem sendo conduzida pela socióloga Esther Solano e a cientista política Camila Rocha e traz ótimas contribuições sobre o tema. De acordo com o estudo, os/as jovens têm se informado e engajado politicamente no ambiente das redes sociais, acessando conteúdos e discussões políticas através de comentários e postagens de “influenciadores de maquiagem e estilo de vida no Instagram e YouTube, games online, canais de empreendedorismo, tiktokers, cantores gospel, gurus de investimento e rappers”. Ou seja, em geral, a socialização política desse segmento ocorre, especialmente, por meio de perfis e canais não abertamente politizados.
De olho nos desdobramentos e desafios dessa tríade juventudes, participação política e internet, as pré-candidaturas à Presidência da República passaram a desenvolver estratégias em busca de adesão junto aos segmentos juvenis do eleitorado. Seja desenvolvendo conteúdos em suas próprias redes sociais, seja interagindo com os influencers ou participando de podcasts, as movimentações de Ciro, Lula e Moro são exemplos dessa tentativa de adesão junto ao eleitorado jovem.
O pedetista, por exemplo, tem uma live semanal intitulada “Ciro Games”, ambientada num cenário com cadeira de gamer, computadores, entre outros ícones que acionam o universo dos jogos na internet que mobilizam uma grande densidade de jovens. Ciro incluiu, nas lives, a linguagem do react, típica das redes, e ao longo das semanas comenta e questiona os discursos de seus adversários (já analisou falas de Moro, Bolsonaro e Lula). O perfil do candidato no Instagram é o mais dedicado a esta estratégia, notoriamente a maior parte das postagens é produzida para dialogar com esse segmento.
Lula, por sua vez, tem apostado em se expor aos/às jovens, principalmente, a partir da participação em programas e podcasts de influenciadores/as. No segundo semestre de 2021, o ex-presidente participou: a) do Programa Triangulando, transmitido no Youtube e comandado por Thelma de Assis (vencedora da edição de 2020 do Big Brother Brasil); b) do podcast Mano a Mano, conduzido pelo rapper Mano Brown (tendo sido o episódio mais ouvido da plataforma no Brasil do ano de 2021); e c) participou do podcast Podpah. Além dessas participações, a assessoria de Lula tem se mantido atenta, sobretudo no Twitter, para garantir uma interação sempre que o petista é mencionado por personalidades, como as indicadas na pesquisa de Solano e Rocha. Inúmeras vezes, viu-se curtidas e comentários do perfil do ex-presidente em postagens de ex-BBBs e outros influencers com considerável relevância.
Moro estreou na estratégia com a participação no Flow, logo antes do fatídico episódio que levou à interrupção do podcast. Em sua entrevista, o ex-juiz demonstrou a busca por uma linguagem mais descontraída e próxima de assuntos que mobilizam as juventudes. Na tentativa de consolidar a estratégia, sua campanha anunciou nesta semana que o pré-candidato irá lançar um podcast intitulado “Morocast”, no qual ele conduzirá entrevistas em um canal no Youtube com diversos atores sociais. A expectativa é que as demandas e ideias apresentadas pelos/as entrevistados/as possam ser incorporadas ao programa de governo do ex-juiz. O pré-candidato do Podemos aposta, portanto, numa estratégia similar à de Ciro Gomes, seu concorrente na terceira via, explorando um canal próprio de comunicação.
O presidente Bolsonaro, apesar de sua expertise no ambiente das redes, tem enfrentado dificuldades diante do eleitorado juvenil. De acordo com o último levantamento do Instituto Datafolha, os/as jovens de 16 a 24 anos correspondem ao segmento eleitoral em que ocorreu a maior queda proporcional de adesão ao presidente, no comparativo entre as eleições de 2018 e 2022.
A atual condição do presidente e as pesquisas indicadas no início desse texto sugerem, portanto, valiosos indícios para os pré-candidatos de 2022: as estratégias comunicacionais e a linguagem das redes são fundamentais para acessar os/as jovens, mas a adesão eleitoral se produz no encontro entre anseios e conteúdos políticos que os satisfaçam.