Mandatos coletivos na proposta do novo Código Eleitoral
Está em discussão no Congresso Nacional a proposta de um Código Eleitoral que revoga a legislação vigente para sistematizá-la em um texto único. O texto base do relatório foi de responsabilidade da deputada federal Margarete Coelho (PP) e aprovado na Câmara por 378 votos a favor e 80 contra.
Alguns pontos estão em disputa, como os que regulamentam as pesquisas eleitorais, tempo de inelegibilidade, período das pesquisas eleitorais, retorno das coligações e, o mais polêmico, a quarentena de juízos.
Embora eu compreenda a curiosidade envolvida nestes pontos, fiquei atenta aos mandatos coletivos, até então sem uma regulamentação própria e que nas últimas eleições têm chamado atenção como nova forma de representação política.
Um pouco de história
A proposta de mandatos coletivos surgiu no Brasil ainda na década de 1990 sem que houvesse adesão consistente. A ideia é que existam colideranças, ou seja, que as atividades legislativas sejam exercidas por um grupo de pessoas envolvidas com as pautas do mandato eleito. Assim, além de um deputado ou vereador, existiriam co-deputados e co-vereadores que dividiriam as funções, o salário e as demais responsabilidades de exercício de mandato. Essas divisões são definidas em acordo entre o grupo e o partido.
A primeira questão que se apresenta sobre o tipo de representação deste modelo é que os mandatos partidários já representam um coletivo. Neste sentido, Silvana Krause, cientista política, considera que a ideia do “mandato coletivo” é uma gestão coletiva.
Para os adeptos do modelo, seria um modo de ampliar a participação da sociedade nas decisões políticas de um mandato. Os componentes do gabinete, para além da divisão do trabalho legislativo, desempenhariam o papel de lideranças em diálogo com diferentes grupos da sociedade e, desse modo, orientariam as decisões parlamentares.
Eleitoralmente, para além da proposta de representação plural, é um modo de concentrar votos de diferentes lideranças e, consequentemente, maximiza a chance de ser eleito.
Esse tipo de formação de gabinete compartilhado busca envolver diferentes grupos sociais e, em alguns casos, envolve também diferentes partidos. O que une as lideranças políticas envolvidas é uma ou mais pautas temáticas.
A candidatura é formada por candidato nominal e suplência do partido detentor do mandato. Em caso de vacância, quando os co-representantes são de um mesmo partido, os acordos sobre o exercício do mandato compartilhado possuem menos conflitos porque já possuem um caminho de atuação política em comum.
Entretanto, quando o gabinete compartilhado é formado por mais de uma legenda, os acordos se tornam difusos. Como se trata de um acordo entre os co-representantes envolvidos, está passível de conflitos e rompimentos no decorrer da legislatura.
Foi o caso do grupo “Mandata Ativista” que ocupa cadeira na Assembleia Legislativa de São Paulo. Formada inicialmente pelos partidos PSOL e Rede, com a licença da representante nominal Mônica Seixas (PSOL), o seu suplente exonerou o co-deputado Jesus dos Santos (PDT). A legitimidade da exoneração esbarra exatamente na ausência de uma regulamentação própria para esse formato de mandato.
Disposições do novo Código Eleitoral
A proposta aprovada como texto base na última quinta-feira, 9, propõe uma regulamentação para as candidaturas coletivas, definidas como “(…) exteriorização de uma estratégia voltada para facilitar o acesso aos partidos políticos aos cargos proporcionais em disputa”.
As candidaturas coletivas, segundo o texto base, devem ser reguladas pelo partido político, autorizada via convenção partidária. O registro deve ser feito pelo nome de um candidato acompanhado pelo nome do coletivo. Ressalte-se a manutenção de um único candidato oficial para todos os fins de direito, ou seja, formalmente, há apenas um representante da candidatura e do mandato.
Para as propagandas, o texto base determina que é preciso deixar claro para o eleitor o nome de urna do candidato e do coletivo. O exercício das atividades legislativas seguirá os parâmetros da representação política dos demais mandatos parlamentares. A referência, portanto, continua em uma liderança do grupo.
O mandato, assim, continua sendo do partido e do candidato nominal. No caso de vacância, a suplência é do partido político do parlamentar formal. A responsabilidade sobre os acordos da representação é também dos partidos (ou partidos) envolvidos.
A proposta de um mandato compartilhado para busca de ampliação da participação na representação política é uma ideia interessante para pensarmos a pluralidade. Caso o texto seja aprovado, teremos maior clareza das regras formais do jogo institucional. As estratégias, por sua vez, continuam como elemento dinamizador da representação.