Bemdito

A ciência que nasce com a gente

De pequenos curiosos a adultos incrédulos, precisamos falar sobre ciência para combater o uso político de quem quer desacreditá-la
POR Yanna Guimarães

De pequenos curiosos a adultos incrédulos, precisamos falar sobre ciência para combater o uso político de quem quer desacreditá-la

Yanna Guimarães
yannits@gmail.com

Ver um ser humano crescer e se desenvolver é uma das experiências mais interessantes (e cansativas) que se pode ter nessa terra. Além de falar muito sobre isso (por favor, não me julguem), os pais com bebês e crianças pequenas percebem o quão incansáveis eles são quando querem testar ou descobrir alguma coisa.

Outro dia, peguei meu filho de 2 anos e meio brincando de desenrolar uma minhoca. Ele encontrou a bichinha no jardim e deve ter achado que era algum tipo de mola. Quando eu percebi do que se tratava o novo brinquedo, disse pra ele colocar a pobre minhoca no chão e ela saiu andando. Ele achou aquilo incrível. Obviamente, quis brincar com ela de novo, mas para a tristeza dele, a minhoca conseguiu entrar na terra e fugir.

Durante esses primeiros anos de vida, é comum as crianças explorarem tudo, muitas vezes sem medo. Sim, eu sei que aqui é um espaço pra falar sobre ciência. Essa história do começo é pra mostrar que todos nascemos grandes cientistas. Queremos experimentar, testar, ver a reação dos adultos, o barulho das coisas que caem no chão. Uma, duas, quantas vezes for necessário.

E por que perdemos isso com o passar do tempo? Acredito que grande parte vem com a falta de paciência dos adultos em suprir a curiosidade das crianças com respostas interessantes. Ou seja, a vontade dos pequenos de descobrir e saber das coisas vai sendo engolida pelas explicações chatas ou que não fazem muito sentido para aquelas cabecinhas.

Mas a ciência está presente em toda a nossa rotina. Desde química na cozinha, passando pelas leis da física ou pelo nosso smartphone, tudo é ciência. É difícil acreditar que ela está sendo posta em questão numa altura dessas da vida. Terra plana? Pessoas que são contra as vacinas? Em pleno 2021? Parece surreal. Por isso, precisamos combater vorazmente essa nuvem de questionamentos sobre a veracidade dos fatos científicos escondida atrás de intenções políticas.

Semana passada, um artigo da Science – uma das principais publicações científicas do mundo – falou sobre os ataques do governo Bolsonaro a cientistas brasileiros. O texto cita o exemplo do novo procedimento adotado no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Agora, um dos principais funcionários do órgão tem a autoridade para revisar todos os “manuscritos, textos e compilações científicas” antes de serem publicados.

Com o precedente aberto, os cientistas temem que o atual governo, que já mostrou sua relação hostil com a comunidade científica, use as análises para censurar estudos que entrarem em conflito com a visão do presidente. “O governo diz que essa não é a intenção. Mas a mudança se soma aos desenvolvimentos recentes que abalaram muitos cientistas brasileiros e deixaram os críticos de Bolsonaro temendo por seus empregos e até mesmo por sua segurança física”, relata o texto da Science.

Diante de tantas atrocidades que temos visto, levantar a bandeira da ciência tornou-se quase uma obrigação. Quem acredita no processo científico e em todo o bem que ele traz deve fazer da ciência um assunto cada vez mais frequente, da forma que puder. Seja nas redes sociais, na imprensa ou nas suas relações pessoais. Ajudar a criança a não perder a curiosidade. Ajudar o adulto a encontrar a credibilidade dos fatos.

O maior exemplo é a criação, em tempo recorde, das vacinas contra a Covid-19. É só com elas que podemos enxergar um futuro perto do normal. Com abraços, encontros e viagens. Tudo graças à ciência.

Yanna Guimarães é jornalista e mestre em Comunicação de Ciência pela UNL. Está no Instagram.

Yanna Guimarães

Jornalista e mestre em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova de Lisboa.