Bemdito

Os caminhos de Izolda e a sucessão de Camilo

Como o acesso ao cargo de governadora pode contribuir para a consolidação de Izolda Cela como candidata pedetista no Ceará
POR Monalisa Soares
Divulgação

A última semana foi marcada pela despedida de Camilo Santana (PT) de seu mandato à frente do Executivo Estadual e pela posse de Izolda Cela (PDT) no cargo de Governadora do Estado do Ceará.

Fato amplamente noticiado e analisado na mídia local, a chegada da primeira mulher ao governo estadual é permeada por expectativas de muitas ordens. Boa parte dessas expectativas dizem respeito à própria condição de gênero, tendo em vista que geralmente, como afirma a socióloga Irlys Barreira, “[…] o exame da capacidade de gestão não é feito a partir de uma pergunta dirigida pessoalmente à mulher e sim ao gênero do qual ela faz parte: têm as mulheres condição de exercer cargos executivos?”. Ainda que Izolda Cela já tenha apresentado suas credenciais técnicas como Secretária de Educação, os olhares agora se voltam para suas habilidades de gerir diversas áreas e também efetuar as tarefas políticas nelas envolvidas.

Gostaria de refletir neste texto sobre um aspecto bastante mencionado e com implicações diretas no processo eleitoral deste ano: a posse de Izolda contribui de modo inequívoco para sua pré-candidatura. 

Em termos de visibilidade, a governadora terá uma oportunidade única para tornar-se conhecida perante grande parte da população, podendo assim desmobilizar uma crítica geralmente acionada pelos opositores à sua candidatura. Para termos uma noção, seu perfil no Instagram em menos de uma semana já alcançou mais de 27 mil seguidores. 

A governadora, em continuidade à linha comunicacional de seu antecessor, posta diária e ativamente seus compromissos em reuniões e eventos e reposta tuítes que repercutem assuntos de relevância. Izolda também vem explorando o interesse midiático por sua ascensão ao governo e tem concedido diversas entrevistas aos meios de comunicação, especialmente TVs do estado, para falar sobre os planos para seus meses de gestão.

É relevante destacar que, com Izolda Cela se consolidando como uma pré-candidatura de fôlego, tensões se formarão em seu grupo político de origem ligado aos Ferreira Gomes. A questão é que há no páreo da disputa pela sucessão de Camilo Santana uma (pré)candidatura “natural”: a de Roberto Cláudio (PDT), lastreado por seu bem-avaliado mandato à frente da Prefeitura de Fortaleza, conhecimento vasto da população e recall eleitoral. Evidentemente o ex-prefeito também tem seus desafios para a disputa pela candidatura à sucessão, entre eles a rejeição e os desafetos que políticos com tempo de atividade acabam por agregar.

O personagem central nesta trama é Camilo Santana. O petista deixou o governo com 78% de aprovação segundo pesquisa do Instituto Opnus. Como enfatizado por alguns analistas, a relevância do percentual está em dois fatos: a) é um índice aproximado ao que Camilo obteve em sua reeleição, com o destaque de que em sua gestão enfrentou diversos desafios, especialmente, a pandemia e o conflito federativo desdobrado por ações do governo federal; e b) esse percentual de aprovação foi o maior que um governador já obteve no estado. Esses dois elementos nos ajudam a entender a relevância política e, sobretudo, eleitoral que Camilo Santana irá desempenhar neste ano de 2022.

Cabe destacar que sua força político-eleitoral já havia se expressado na disputa municipal de 2020 em Fortaleza. As pesquisas indicavam que o apoio de Camilo Santana era bastante positivo para um candidato/a. Isso se traduziu na mobilização de sua imagem tanto por Luizianne Lins (PT) quanto por José Sarto (PDT). Neste ano, a pesquisa Grupo Otimista Real Time Big Data afirmou que a combinação de apoio do ex-presidente Lula e de Camilo dão maior vantagem um/a candidato/a.

A centralidade e a força eleitoral de Camilo Santana (PT) são exemplos do dilema que a socióloga Rejane Carvalho evidencia no contexto de sucessão de ciclos políticos: “a liderança política que consagra a continuidade de um ciclo político enfrentará sempre, ao término do seu segundo mandato, a dificuldade da escolha de quem irá sucedê-la. Alguém com força política própria? Ou um candidato que replique sua própria imagem?”.

Diante de tal dilema e considerando o contexto das eleições deste ano no Ceará, um elemento está evidente – a força política de Camilo Santana. Isso indica que a herança simbólica e o legado serão aspectos relevantes na construção da continuidade. Nesse sentido, a escolha do/a candidato/a deve considerar, além de atributos individuais necessários a qualquer liderança política, a capacidade de realização de transferência de votos. Afinal, o legado nas eleições se constitui especialmente de símbolos, exigindo um processo “quase alquímico”, o que proporciona uma preponderância política de quem exerce a transferência nos rumos do processo eleitoral.

Monalisa Soares

Doutora em Sociologia e professora da UFC, integra o Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia e se dedica a pesquisas na interface da comunicação política, com foco em campanhas eleitorais, gênero e análise conjuntura.