Qual é o tamanho do seu p… prédio?!
Circularam nas redes e em meios de comunicação diferentes textos e textões sobre os edifícios “Platina 220” e “Figueira Altos do Tatuapé”, em construção na Zona Leste de São Paulo. Fotos da extensa sombra gerada pelo Figueira sobre o restante do bairro viralizaram nas redes, provocando reflexões sobre as consequências ambientais do modelo de desenvolvimento urbanístico que representa.
Embora a excelente matéria produzida por Paula Paiva Paulo para o G1 destaque essas reflexões e críticas, utiliza como gancho para fisgar o leitor o fato de que eles passaram a ocupar recentemente o primeiro e o terceiro lugar no ranking de prédios mais altos da cidade, com 172 e 168 metros de altura, respectivamente.
A sagacidade da reportagem, refletida na manchete, reside em compreender o que poderia despertar o interesse dos leitores e construir a narrativa a partir disso. Não julgo a escolha editorial, tampouco serei aquele a dizer que tamanho não importa. As consequências derivadas do tamanho importam – e muito -, pois reverberarão diretamente no seu entorno e na cidade como um todo. Contudo, precisamos estar atentos às armadilhas que a arquitetura fálica esconde ao conferir ênfase à altura.
Da mesma forma que o nome “Platina”, escolhido para o edifício, remete às categorias platinum de cartões de crédito e outros tipos de assinaturas, a exclusividade de morar ou trabalhar no prédio mais alto de São Paulo também tem seus encantos. Disso, certamente se alimentarão a comercialização das unidades do edifício e também o marketing urbano de São Paulo como um todo.
Inseridas na lógica de produção capitalista – e, por isso, vistas como produtos a serem consumidos, em vez de um direito de seus moradores -, as cidades procuram se destacar através de projetos e marcos arquitetônicos, fomentando ativamente a constituição de símbolos urbanos
Se na história temos exemplos de vários monumentos (literalmente) faraônicos, que, como as pirâmides, buscavam refletir poder e riqueza daqueles que regiam a sociedade, contemporaneamente, continuamos a erigir estranhas catedrais que refletem as relações sociais de poder ao mesmo tempo em que aprofundam os processos de dominação capitalista. Exemplos estão presentes desde obras públicas, como a Ponte Estaiada de São Paulo e os teleféricos em favelas do Rio de Janeiro, até mesmo na arquitetura fálica destes dois edifícios privados.
Não devemos, portanto, reforçar essa relação com via de mão dupla entre arquitetura, monumentalidade, símbolos e poder, conferindo demasiada importância ao seu tamanho. Para transpor essa armadilha, é preciso questionar os impactos, as motivações e, principalmente, os beneficiários desses projetos, além, obviamente, dos agentes do setor imobiliário e da construção.
A quem se destinam as unidades residenciais de mais de 300 metros quadrados? Quais serviços e empresas poderão se instalar num edifício cujo condomínio deverá manter mais de 20 elevadores em funcionamento? Quem poderá circular por esses edifícios? Quais corpos serão permitidos e quais serão proibidos de transitar neles?
Não deixemos que o tamanho dos edifícios seja o foco de nossa atenção. Perguntemos qual será o bem que farão ao conjunto da cidade, quais serão seus benefícios aos cidadãos que não residirão ou trabalharão neles, como estimularão a ocupação saudável e segura da cidade e de espaços públicos, como servirão para a redução das desigualdades. Quando alguém se interessar pelo tamanho de um prédio, diga que esse não é seu principal atributo, mas, sim, o uso que se faz dele. Como no sexo, o fundamental é que seja bom para todos.