Brinde
Julgam que por não se terem encontrado antes,
nada entre eles nunca ainda se passara.
E o que diriam as ruas, as escadas, os corredores
onde se podem há muito ter cruzado?
Wislawa Szymborska
O primeiro encontro costuma se dar numa zona tenebrosa, entre o desastre e o encantamento. A situação em geral pende para o infortúnio, que pode ser mesmo terrível, mas também engraçado. Se rimos ao narrar um primeiro encontro a dois – o “date” tão badalado pelas galeras dos aplicativos de paquera -, então ao menos algo de bom aconteceu, por mais desajeitado ou constrangedor que tenha sido aquele momento.
Os termos “bem-sucedido” ou “mal-sucedido” não comportam esse tipo de experiência, pois tratam-se de adjetivos engolidos pela ordem dos negócios, pela lógica mercantil das transações. As noções de sucesso, êxito, falha e fracasso parecem avessas ao campo dos afetos, terreno sem lei onde continuamos sendo reviradas pela onda que surpreende e sempre nos apanha.
Ao conversar sobre o assunto com amigas, fiquei pensando em que instrumentos utilizamos para decidir se o encontro com expectativas amorosas vale mesmo a pena a esta altura da vida em pandemia. Admiro quando a coragem ultrapassa a preguiça, o que já é um passo considerável. A verdade é que, para muita gente, sair de casa se tornou uma opção menos interessante.
Então, que pessoa ou figura – levando em consideração os perfis compostos por imagens e palavras nas redes – é capaz de mobilizar em nós energias para o tradicional tête-à-tête? É tão urgente quanto assustadora a presença do outro. Sentimos falta e ao mesmo tempo tememos porque estamos menos hábeis, talvez um pouco intolerantes ou afoitas demais.
Resta a tal da intuição, essa coisa escorregadia que a gente não sabe definir, mas que aprendemos a usar em certas ocasiões como único termômetro possível. Já atravessei países e línguas para um primeiro encontro no inverno, despi-me aos dez graus e produzi calor. Já beijei um rapaz na parada de ônibus, esperando o circular, e arrependi-me minutos depois. Outra vez, não consegui beijar o homem por quem havia esperado anos simplesmente porque ríamos sem parar no banco traseiro do táxi e nossos dentes incisivos se chocavam, nervosos.
Quando o tema do primeiro encontro é posto na roda em meio às minhas amigas, chegamos às lágrimas, muitas delas acompanhadas de gargalhadas, uma vez que o tempo tem o poder de amenizar certos sofrimentos. Os relatos vão de crise de tosse, cerveja derramada, barracos na recepção do hotel, fuga no meio da noite a pequenos golpes na hora de pagar a conta do restaurante. Um brinde aos primeiros encontros! Alguns rendem, geram segundos e terceiros e quartos, vão crescendo ao longo dos anos e tornando-se uma jornada maior, de amizade, carinho, paixão e amor. Outros podem inspirar boas histórias.