MamãeFalei e a primaiada do MBL
Arthur do Val, de codinome “MamãeFalei” (eu sei…), é deputado estadual de São Paulo e uma das mais afamadas lideranças do Movimento Brasil Livre (MBL), agremiação ideológica com gosto pelo liberalismo econômico, habitada por apreciadores de cerveja artesanal, pagamento por aproximação e cachorros de médio a grande porte chamados “Thor” – ou qualquer outra divindade nórdica que os valha.
Na última semana, MamãeFalei (o jeito é se conformar) esteve flanando por uma Ucrânia sitiada em conflito para, fomos levados a crer, dar amparo humanitário à comunidade civil e plantar sementes de liberdade e soberania no combalido solo daquela nação. Que coisa linda, MamãeFalei.
Quando essa missão aparentemente bem sucedida já corria nos acréscimos, e MamãeFalei já flanava em ponte aérea de volta para casa, fomos, sobretudo MamãeFalei, pegos de surpresa com o vazamento de áudios nos quais o filantrópico deputado despejava uma caçamba de chauvinismo e porcarias sexistas sobre a reputação das mulheres ucranianas. Que coisa feia, MamãeFalei.
Enquanto eu acompanhava a correnteza de esclarecimentos, desagravos e lorotas em geral boladas por Arthur e pelo MBL, sua incubadora política, reacendia em mim um sentimento antigo, que me acompanha desde quando prestei atenção no MBL pela primeira vez (um momento especialmente horrível): o sentimento de que o MBL é, em ideário e atitude, uma confraria dos primos que mais detestamos na vida.
No MBL estão todos os primos que aos 12 anos voltaram da Disney com um boné do pateta, um par de Nike Shox e todo um arsenal de muambas eletrônicas com as quais eles nos permitiam brincar por 5 minutos uma vez perdida, só para que nós, não treinados em tais tecnologias, perdêssemos o jogo já de cara, e o infame pudesse deixar tacitamente estabelecido que ele era o primo antenado e a gente, o primo matuto.
No MBL estão os primos que aos 15 anos se gabavam de estacionar o Sedan do pai na garagem quando ele chegava da empresa, narrando com ares de profissional vivido as fantásticas manobras executadas naquele um metro de rampa entre a rua e a garagem. E ninguém na rodinha de ouvintes, segundo ele, seria capaz daquela façanha. Só o primo MBL tinha a manha, frieza de nervos e visão periférica para realizar o impensável feito de guardar um carro.
Dos 18 aos 20 anos, o primo MBL escafedeu de nossas vistas e convívio para partir em intercâmbio. Foram anos felizes.
Aos 21, exalando frescores internacionais e maneirismos importados, ele reaparece – sem convite – no churrasco de primeira eucaristia da nossa irmã caçula, pra desfilar sua identidade de jovem cosmopolita e revelar planos de entrar ativamente na política, enquanto reclama da salada de batata com maçã e maionese da nossa mãe: “Nossa, tia, mas essa batata ainda pedia uns 2 minutos de cozimento, viu?! Tá BEM dura!”.
Já nós, enxaguando a alma em cachaça numa mesa de canto, finalmente desobrigados, pela adultice, de sermos amigos do primo MBL, nos limitamos a indagar, acenando para ele a distância: “E essa carniça voltou quando?!?!”.
Vai caminhando a vida e a maré do tempo traz, vez em quando, notícias vagas do primo MBL… “Formou-se”… “Tá rico”… “Casou”… “Separou”… “Casou de novo”… “Comprou um Golden Retriever lindo, o Odin”… “Trouxe esse relógio pra mim de Miami”… “Menino, tu soube do áudio que vazou do nosso primo???”.
Soube não, cadê????