A Flac está de volta
Falar de livros com gente que gosta de livros é uma das grandes alegrias do bom leitor. Quando o interlocutor desse diálogo é o próprio autor de um daqueles livros, a alegria se multiplica. Isolados desde o início de 2020, nos tornamos leitores melhores. Lemos mais e conversamos mais sobre nossas leituras. Acompanhando o incremento nos índices do comércio virtual de livros, multiplicaram-se os clubes de leitura — agora livres de limites geográficos — e as lives com escritores, tradutores e editores. Nesse ano e meio de pandemia, sobrevivemos ao Brasil e àquele-que-não-merece-ser-citado por meio das palavras.
Devidamente vacinado, reunindo coragem para, pouco a pouco, voltar às minhas livrarias favoritas, recebi há algumas semanas uma ligação que, neste cenário de quase-otimismo que nos permitimos experimentar, me encheu de alegria. A Festa Literária do Ceará, Flac para os íntimos, antiga Festa Literária de Aquiraz, cuja última edição havia sido realizada em 2017, havia despertado de um descanso que eu julgava eterno. Ao longo das últimas três semanas, esperei ansioso pelo melhor momento para fazer o anúncio: o calendário cultural do Ceará voltará a ter seus dias de literatura.
Os preparativos
É isso. A Flac está de volta. Os preparativos estão a mil. Ligações são feitas, e-mails são enviados, reuniões intermináveis ocupam as horas das manhãs de sábado. Tudo pela Festa. Tudo pelos livros. Olhe bem para sua prateleira de lançamentos dos últimos dois anos: provavelmente um daqueles autores estará entre os convidados. As mensagens de confirmação começam a chegar, os cachês são negociados, os horários são estipulados, o tema de cada mesa é decidido. Arma-se uma festa.
E eu, que já estaria suficientemente satisfeito pelo retorno da Flac depois de um intervalo que me pareceu infinito, fico ainda mais feliz por ter sido, uma vez mais, convidado para assumir a curadoria do evento. Uma responsabilidade que se torna ainda mais solene quando vejo o nome das que me antecederam: a escritora Socorro Acioli e a jornalista Mona Dorf. Foram elas, ao lado de uma equipe que sempre foi majoritariamente feminina, que sonharam, conceberam e realizaram a Flac, uma festa que, desde o início, se apresenta como um espaço de convivência entre leitores.
Vale citar alguns nomes. Aurea Figueira, profissional da comunicação que fez grande aposta trazendo para o Ceará, há quase dez anos, a ideia da festa literária, e que continua, ano após ano, renovando esse sonho. Terezinha Holanda, que desde a primeira edição articula a riquíssima participação de professores e alunos da rede pública junto ao evento. E as produtoras Dora Freitas e Priscila Lima, que chegaram recentemente e se dedicaram para tornar possível essa nova edição.
A urgência
Ainda não será dessa vez que nos reuniremos pessoalmente, sob uma tenda ao ar livre, para conversar com nossos autores favoritos. Decidimos que seria melhor, por segurança, por respeito aos que perdemos, realizar uma edição online da festa. A Flac 2021 será virtual, mas os esforços para sua realização e a interação que queremos promover são absolutamente reais e concretos. Como nas edições anteriores, queremos estabelecer um espaço de troca no qual tão importante quanto a voz do autor é a do leitor.
Mais que isso. A Flac 2021 será a mais política e urgente de todas. Vamos falar de raça, de gênero, de amor, de história, de loucura, de pobreza, de trabalho, de classe e de luta. Teremos escritoras e escritores, poetisas, atores e atrizes, roteiristas, músicos e jornalistas. Acreditamos que não podemos entender o Brasil de 2021 sem essa diversidade de protagonistas e sem o diálogo sobre esses temas. Acreditamos também que da literatura pode nascer o desejo de mobilização e mudança, a convicção de que a palavra é ferramenta de luta e resistência.
Ao longo das próximas semanas, começaremos a divulgar, nas redes da Flac e aqui no Bemdito, os primeiros autores confirmados, as mesas formadas, os livros indicados, as oficinas que serão ofertadas. Tudo gratuito. Tudo aberto e virtual, para quem quiser. Para todo mundo.
Compartilho meu entusiasmo para que vocês também vibrem pelo retorno dessa festa ao nosso estado. A festa é nossa, é do Ceará, e está mais viva do que nunca.
Até daqui a pouco.