Finalmente, um dia de paz!
Não há expressão que mais define nossa situação atual do que aquela “o brasileiro não tem um dia de paz”. Se o mundo viveu as dificuldades e incertezas que uma pandemia pode causar, nós por aqui vivemos tudo mais intensamente. E pior, enquanto o mundo começa a retomar sua vida normal com viagens, eventos esportivos e até shows musicais, seguimos nesse barco furado ainda sem conseguir enxergar a praia mais próxima. Nesses últimos longos meses de pandemia, quem não se pegou rolando interminavelmente por más notícias (especialmente envolvendo o governo federal) nas redes sociais e lendo cada boato preocupante que aparecia? Eu tentei fugir, mas vez ou outra ainda preciso me policiar para não consumir tanta informação desagradável.
O fato é que a biologia dos nossos cérebros pode desempenhar um papel nisso. Pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Washington, em St. Louis, identificaram áreas e células específicas no cérebro que se tornam ativas quando um indivíduo se depara com a escolha de aprender ou de se esconder de informações sobre um evento adverso indesejado e que ele não tem poder para prevenir. As descobertas, publicadas em 11 de junho na revista Neuron, podem ajudar em processos como transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e ansiedade – sem mencionar em como todos nós lidamos com o dilúvio de informações, uma característica da vida moderna.
“Os cérebros das pessoas não estão bem equipados para lidar com a era da informação. As pessoas estão constantemente verificando, checando, olhando notícias. E algumas dessas checagens são totalmente inúteis. Nosso estilo de vida moderno pode estar recriando os circuitos em nosso cérebro que evoluíram ao longo de milhões de anos para nos ajudar a sobreviver em um ambiente incerto e em constante mudança. Acho que entender os mecanismos de busca de informação é muito importante para a sociedade e para a saúde mental em um nível populacional”, explica o autor sênior do estudo, Ilya Monosov, professor associado de neurociência, neurocirurgia e engenharia biomédica.
Para encontrar os circuitos neurais envolvidos na decisão de buscar informações sobre possibilidades ruins, dois macacos foram ensinados a saber quando algo desagradável estava por vir. Eles foram treinados para reconhecer símbolos que indicavam que poderiam estar prestes a levar uma irritante baforada de ar no rosto. Os pesquisadores mediram se os animais queriam saber o que iria acontecer, observando o sinal, ou se desviavam os olhos. E, assim como as pessoas, os dois macacos tinham atitudes diferentes em relação às más notícias, no caso, à baforada de ar. Um queria saber, o outro preferiu não.
A diferença nas atitudes em relação às más notícias era notável, mas os macacos pensavam de forma igual quando se tratava de receber boas notícias. Quando tiveram a opção de descobrir se iam ganhar um pouco de suco, os dois decidiram saber logo. Para os pesquisadores, isso foi um sinal de que as duas atitudes podem ser guiadas por processos neurais diferentes, o que ajuda a compreender os circuitos neurais ligados à incerteza. O estudo é um passo em direção a melhores terapias para pessoas com condições como ansiedade e TOC, que envolvem a incapacidade de tolerar o incerto.
Voltando aqui para o nosso terreiro, eu lhe pergunto: tem incerteza maior do que viver neste Brasil? Se tem, desconheço, também não vou mais atrás. O que sei é que o dia de paz dessa brasileira aqui finalmente chegou. Vai ser sábado, quando vou tomar a primeira dose da minha vacina. E vou, enfim, começar a avistar o fim desse caminho tortuoso que foi passar por uma pandemia num país conduzido por um falso Messias.