Recordações de veraneio
Se você abrir uma pessoa, irá achar paisagens.
Se me abrir, irá achar praias.
Agnès Varda
Gosto de tomar um bocadinho de sol. Se pudesse, tomaria sem roupa para tingir também as partes íntimas, sempre tão pálidas em contraste com o resto do corpo, especialmente as canelas e os antebraços. Ocorre uma espécie de comunhão com o astro incandescente quando me deito sobre a canga e entrego-me por inteiro à luz e ao calor. O ato de entrega e o aquecimento imediato da pele e dos órgãos, que cresce até o limite do mergulho, inspiram um erotismo velado.
Li recentemente “A vida submarina” e “Risque esta palavra”, ambos livros de Ana Martins Marques, nos quais há poemas dedicados à casa de praia, ao verão, ao mar, às memórias das férias. Tenho assistido aos filmes de Guillaume Brac e todos me provocam certa nostalgia do fervor da puberdade, quando saíamos para o idílio, livres da escola. Penso naqueles jovens aos quais foi negado o gozo das famosas férias de verão, terreno regado de aventuras calorosas, romances platônicos, profundas buscas existenciais e grandes frustrações.
Na adolescência, o destino das viagens de minha família se alternava entre o sertão e o mar. Confesso que me sentia mais atraída pelo litoral, pois já morava no interior, dentro da geografia sertaneja. As praias para onde viajávamos eram costas lisas, de vegetação escassa, ou paredões de falésias coloridas. Numa dessas praias, por entre fendas nas rochas, encontrávamos areias de diversas tonalidades, do ocre ao azul, e aquilo me fascinava.
Por um tempo, alugávamos casas simples e espaçosas. Numa dessas casas, ouvi pela primeira vez o termo “rústico” empregado de forma elegante na descrição da arquitetura, da mobília e da decoração do espaço para se referir a paredes de tijolos expostos, móveis de madeira e objetos de palha. Anos mais tarde, entendi que verdadeiramente rústico era o modo de vida de famílias que lutavam por escapar diariamente da fome nas comunidades do semi-árido nordestino.
Outras vezes passávamos a temporada de julho ou dezembro em apartamentos de amigos de meus pais, em condomínios de classe média, dispostos em vários blocos de três ou quatro andares. A estadia nesses condomínios era empolgante porque proporcionava o contato com muita gente a atravessar os calçadões, perfumando os ares com sundown e óleos bronzeadores. Para uma adolescente um tanto tímida como eu, os dias no condomínio eram proveitosos. Havia a dinâmica das quadras de esporte, das piscinas, da lanchonete, dos jardins, das inúmeras famílias chegando e partindo.
Menstruei pela primeira vez na praia. Não entendi quando vi aquela manchinha marrom no biquini. Minha mãe foi quem se deu conta. Disseram-me para evitar grandes esforços, então achei que já não podia subir as escadas carregando muitas sacolas de compras nem pensar com tamanha urgência no menino moreno do bloco ao lado. O pior foi estar diante do mar e não usufruí-lo. De repente, a vida parecia se opor a mim. Foi quando aprendi a jogar baralho e a entranhar-me nos livros.